Doce Tiê |
Bem longe de 2010, no ano de 1985, surgia uma cantora folk chamada Suzanne Vega. De voz delicada, acompanhada de parcimoniosos sons eletrônicos, toques e acordes de guitarra e violão, sua música era uma espécie de oásis, sem algum parentesco com os sons que estavam sendo gestados no extremo noroeste americano e revelariam no fim dos anos 1980 bandas como o Pearl Jam – ativos e bem até hoje –, Nirvana e Alice in Chains. Do outro lado do oceano, em 1985, fervilhavam tendências diversas: desde o “punk” John Lydon com seu PIL (Public Image Limited), The Cure, Jesus and The Mary Chains e New Order, que podem ser classificados como os da área mais “barulhenta”, a bandas mais “específicas” como a inesquecível, The Smiths, Cocteau Twins, Durutti Column e mais um bando que lançava discos pela gravadora independente Factory.
Em 2010, ou melhor, no meio de 2009, conheci Tiê. E lembrou-me, de cara, Suzanne Vega. Não pela voz, mas pelo tom doce, ou se quiserem, “fofo” e pelas parecenças de estilos que, costumeiramente, associam-se ao folk. Apesar de ser uma palavra que define um estilo típico da América do Norte, disseminou-se a ponto de existir, por exemplo, uma dupla norueguesa – Kings of Convenience – desse gênero, como deve ter muitas em outros lugares distantes. No ano passado, falou-se muito mais de outras cantoras, e bastante de Mallu Magalhães, que se encaixa menos nessa classificação. Bem, falaram tanto mal da garota que ouso ter o impulso de defendê-la. Seu segundo CD não é pior do que o melhor de Ana Carolina. Vai, existe competência sim em Mallu. Essa coisa de falar mal do outro não tem fim: é tão fácil!
É possível que muitos achem o som da cantora e compositora Tiê bobinho, primário. Existe, porém, algo que a diferencia das dezenas – ou centenas – de cantoras que surgiram nos últimos anos. Em seu jeito “básico” de compor e de falar de sentimentos “básicos” é capaz de emocionar. E de um jeito parecido ao de como Suzanne Vega emocionou milhares de ouvintes. O primeiro álbum, lançado pela A&M Records, em1985, recebeu disco de platina na Inglaterra, o que significa que vendeu muito bem. São inesquecíveis Marlena on the Wall, Undertow e The Queen and the Soldier, que tem uma letra descritiva sobre o soldado que se vê à frente da rainha para saber por quem mata e, antes de saber, é morto “e a batalha continuou”. Em seu próximo álbum emplacaria sucessos como o “a capella“ Tom’s Diner e Luka.
Um pouco como Vega, Tiê emociona de forma despojada no álbum Sweet Jardim, lançado no meio do ano passado. A primeira faixa tem ela e o violão, apenas. Assinado Eu tem uma letra que tem endereço, como uma carta. A segunda, Dois é a melhor de todo o CD: “Como dois estranhos,/ cada um na sua estrada,/ nos deparamos, numa esquina, num lugar comum.// E aí? Quais são seus planos?/ Eu até que tenho vários./ Se me acompanhar, no caminho eu posso contar.// E mesmo assim, queria te perguntar,/ se você tem aí contigo alguma coisa pra me dar./ Se tem espaço de sobra no seu coração./ Quer levar minha bagagem ou não?// […] Eu vou levar sua bagagem e o que mais estiver à mão.” O arranjo é despojadamente belo: voz, violão e sons do piano Fender Rhodes. Vem Andar depois, Passarinho, que parece uma cantiga de ninar embalada por um cello, o violão e poucas notas de piano. Tudo é pouco, encantadoramente simples, algumas vezes infantil, adolescente, singelamente básico como “Se eu pudesse mostrar/ o que você me deu,/ eu mandava embrulhar, chamaria de meu.// Melhor forma não há/ pra guardar um amor,/ então preste atenção,/ ou me compre uma flor.” e, somando tudo isso, o tudo é muito.’’
Veja o clipe da linda Dois:
Dois, Tiê from juliana mundim on Vimeo.
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